Dentro do já apelidado Big Boom das narrativas digitais e interativas, há uma crescente produção de narrativas factuais – ou não ficcionais, melhor dizendo. Essa produções esboçam um campo novo e híbrido que acontece na interseção entre documentário, vídeo digital, arte interativa, netart, games, instalação. Parte da produção internacional tem se denominado como webdocumentário (WebDoc), living documentary ou documentário interativo (I-DOCs) e já tem sido, inclusive, reconhecida em alguns festivais internacionais renomados de cinema que criaram programas próprios, como o Sundance (New Frontier Story Lab) e o International Film Festival of Documentary (IDFA DocLab).
As propostas, procedimentos, processos produtivos e características das obras são muito diversos e apontam uma infinidade de possibilidades. A própria terminologia para se referir ao campo ainda está em formação – associam documentário ao suporte da internet e à interatividade, mas não dão conta da diversidade dos projetos. O que parece certo é que o estatuto do espectador dos documentários lineares requer uma nova nomenclatura: com a interatividade, o espectador vira interator. O interator entra em cena através da interatividade na ampla variedade das narrativas interativas digitais e não ficcionais.
As obras apontam uma infinidade de possiblidades. A proposta e temática de Offshore (offshore-interactive.com) não tem nada a ver com a de Remembrance of Things to Understand (webdoc.chrismarker.ca). A forma de interatividade e experiência do usuário são muito diferentes entre La Vie a Sac (lavieasac.com), Walking the Edit (walking-the-edit.net) ou Prison Valley (prisonvalley.arte.tv). Apenas para citar dois exemplos, as estruturas narrativas e plataformas utilizadas de Hollow (hollowdocumentary.com) não condizem com as de Le défi des bâtisseurs (cathedrale.arte.tv). O processo de produção e recursos necessários para se fazer FortMcMoney são absurdamente maiores que produções com softwear livre como Ceci n’est Pas Embres (embres.ca).
A produção artística e crítica no Brasil dessa nova tendência mundial de narrativas interativas não tem acompanhado essa produção de reconhecimento internacional. Talvez isso aconteça pela falta de integração entre as inovações estéticas e tecnológicas que esse campo requer para se desenvolver. Esses projetos requerem novas ferramentas, habilidades técnicas e conhecimento de diferentes áreas, como do audiovisual, design e programação. Talvez por isso a nova produção tem se concentrado em pólos criativos como na França e no Canadá. Em 2010, o canal francês France 2 criou ume série de webdocumentários. Em dois anos, o National Film Board (NFB), no Canadá, principal realizador do mundo, já contava com mais de 30 títulos numa rubrica dedicada a projetos interativos, dentre os quais o super premiado Highrise (highrise.nfb.ca), Welcome to Pinepoint e Capturing Reality – referências internacionais. Em paralelo, em Montreal, universidades como a Concordia University, a UQAM e a University of Montreal mantêm centros de pesquisa e experimentação estética e tecnológica no mesmo campo.
O Bug404 se propões a fazer e divulgar uma pesquisa sobre os webdocs e documentários interativos. Buscaremos realizar um mapeamento crítico das produções internacionais e nacionais, que apresente e analise obras que sejam referências fundamentais em função da diversidade de propostas, procedimentos e características. O mapeamento será orientado para servir como subsídio para formação de público, para realização de processos criativos brasileiros e desenvolvimento da produção crítica. Partiremos dos exemplos e dos textos de alguns autores internacionais que já fizeram algo parecido, como Sandra Gaundenzi e Arnau Castells Gifreau. É nessa errânica que acreditamos; na busca da pesquisa, no erro das tentativas e realizações. Durante esse processo, vamos criar um glossário desse campo em surgimento e colocaremos em questão os próprios termos: serão webdocumentários, documentários interativos, living documentary, hipervídeos? Como entender melhor esse web bug doc…!?