A economia criativa do digital pulsa intensamente em Montreal (Canadá). A cidade é considerada um dos principais, senão o principal, pólo de criação de mídias digitais e interativas. Este fato se deve a uma combinação de fatores, como o papel muito ativo de instituições como o National Film Board, com uma vasta história em inovação na linguagem do documentário, a forte presença da indústria do videogame, os programas de pesquisa-criação em mídias digitais e interativas nas universidades, a grande concentração de estúdios de criação digital e de centros de arte e tecnologia (Phi Centre, Société des Arts et Technologies – SAT, entre outros), e enfim, os diversos festivais de cinema que criaram programas dedicados aos formatos digitais e interativos (Festival du Nouveau Cinéma, RIDM).
Com o crescimento recente da Realidade Virtual (Virtual Reality, ou VR, em inglês), Montreal tornou-se um dos principais centros de inovação e de desenvolvimento também em VR.
O Mutek VR Salon 3, por exemplo, realizado recentemente, reuniu personalidades de grande influência do meio das narrativas interativas para discutir a Realidade Virtual. Estavam presentes criadores, fabricantes de hardware, instituições que financiam projetos em VR e pesquisadores.
Apresentaçao de Maria Rakusanova (Samsung). Foto: Mélisandre Bouchard-Berger
Os painéis abordaram questões mais técnicas, mas também os problemas da distribuição e das práticas de criação. Uma discussão que sempre aparece nestes encontros é a questão do modelo econômico: quando o VR se tornará auto-suficiente em termos econômicos, ou seja, não dependerá mais de instituições financiadoras?
Hadrien Lanvin, de Innerspace VR, estima que em 2020 o mercado de VR será economicamente viável. Segundo Lanvin, ainda não há conteúdo suficiente para atrair um público maior. Ele também ressaltou que o momento atual é propício para produtores independentes, pois permite a experimentação enquanto ainda não há uma linguagem ou padrões estabelecidos. Quanto à distribuição, Lanvin ressaltou que no momento, a melhor estratégia é de distribuir o conteúdo no maior número possível de plataformas, e indicou as 4 principais: SteamVR (principalmente para games), Vive Port (para os óculos Vive HTC), PlayStation VR e Oculus.
Nos estudos de caso, os criadores do projeto em VR e AR (Augmented reality, ou realidade aumentada), The Enemy, destacaram a importância dos protótipos para conseguir convencer parceiros a embarcarem no projeto. Os produtores também destacaram que a fase de testes e as medidas de impacto no público foram fundamentais para orientar algumas das decisões criativas.
Outro ponto de destaque abordado nos painéis foi a utilização de VR em outras áreas além dos conteúdos culturais e jogos, como no mercado imobiliário (possibilitando visitas a distância ou em imóveis ainda em construção), na saúde (para cirurgias, tratamentos anti-stress, diversão para crianças internadas, entre outras), turismo, educação e design.
O último painel foi um pouco mais provocador, com a intenção de criar um anti-manifesto VR. Participaram grandes nomes do documentário interativo, como Kat Cizek (criadora de Highrise, membro do MIT Open Doc Lab), Louis-Richard Tremblay (National Film Board do Canada), Simon Wilkinson (CiRCA69), entre outros. Uma questão importante foi levantada: como garantir a diversidade na criação de VR? Como evitar que aconteça com a realidade virtual o mesmo que aconteceu com a internet, ou seja, que as grandes corporações terminem por dominar e monopolizar a criação e os meios de distribuição? O debate foi intenso, mas está longe de ser esgotado, e acho que vale continuarmos esta reflexão.
Anti-Manifesto VR. Foto: Julia Salles
Recentemente aconteceu outro encontro profissional sobre VR aqui em Montreal (Marché de la Réalisté Virtuelle 2017), estive presente e farei um post contando um pouco da experiência.